“Uma educação crítica é aquela que permite a pluralidade de narrativas”
Por Raphael Preto
“Pós-verdade” – que significa que opiniões e crenças têm mais valor do que fatos objetivos – foi eleita em 2016 pela Universidade de Oxford como a palavra do ano. Levando em consideração a relevância desta expressão na sociedade contemporânea e seu impacto na educação, a segunda edição do Escolas Transformadoras Debate deste ano teve como tema “Não sou robô: pós-verdade e pensamento crítico na educação”, roda de conversa com transmissão ao vivo realizada no dia 17 de maio.
Participaram do encontro Amanda Rahra, co-fundadora da escola de jornalismo Énois; Ana Paula Corti, socióloga, membro da Rede Escola Pública e Universidade (REPU) e professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, e Nilson José Machado, professor titular da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. O debate foi mediado por Antonio Lovato, cocoordenador do programa Escolas Transformadoras.
No início do debate, os participantes discutiram sobre a importância do desenvolvimento do senso crítico no campo da educação. Na teoria, não há quem defenda uma escola que não ensine a pensar. Entretanto, o sucateamento do ensino público cria dificuldades para o desenvolvimento da criticidade na sala de aula. “Há uma contradição entre a prática e o discurso. Educação está na moda, todo mundo diz que é prioridade. Mas que educação é essa que todos falam? A educação básica que é oferecida hoje, de maneira geral, não é crítica de verdade, apesar de usarem muito essa palavra”, diz a professora Ana Paula.
Para ela, o movimento Escola Sem Partido representa uma ameaça ao desenvolvimento do pensamento crítico, além da possibilidade de abalar a relação entre professor e aluno. “Esse movimento estimula a denúncia dos estudantes em cima do que seus professores dizem. Eu não consigo pensar em dar aula sem ter uma relação de confiança com meu aluno. Ao mesmo tempo, sei que quando discuto questões de gênero nas minhas aulas, isso incomoda algumas pessoas. E é bom que incomode”, ironiza.
Para Amanda Rahra, que no dia a dia dá aulas e percorre diversas escolas tendo contato com estudantes, uma escola que não leve em consideração as potencialidades e o protagonismo de cada jovem não terá sucesso. “A gente precisa parar de criar rótulos e de acreditar que existem ‘alunos problema’. Precisamos levar em conta a opinião do jovem para mudar a educação”, alerta.
Ações encabeçadas por movimentos como o Escola Sem Partido são potencializadas por meio de notícias falsas, como, por exemplo, a informação falsa de que a vereadora assassinada no Rio de Janeiro, Marielle Franco – que era defensora dos direitos humanos desde o início de sua militância –, teria tido relações com o traficante Marcinho VP. Amanda acredita que tais notícias precisam ser analisadas, checadas e combatidas. “Realizar checagem de fatos está associado com a esquerda, e não é nada disso. A gente precisa estar ligado. O erro chega em muito mais lugares do que o acerto. Uma notícia falsa tem muito mais destaque do que uma retratação, por exemplo.”
Para Nilson Machado, o educador deve evitar a formação de narrativas maniqueístas. “A boa educação é analítica e dá aos alunos condições para tomarem suas próprias decisões. A expressão ‘pensamento crítico’ é uma bobagem. Todo pensamento, por princípio, é crítico”, afirmou. A falta de uma política pública consistente e contínua acaba fazendo com que a educação venha aos poucos perdendo a função transformadora e adquirindo aos poucos um caráter utilitarista. “Na educação básica, as disciplinas devem contribuir para formar pessoas. O ENEM começou dando um peso muito grande valorizando as competências e habilidades, em detrimento das disciplinas isoladas. Isso foi positivo, mas essa tendência foi diminuindo e hoje, é um processo seletivo como outro qualquer”, lamenta.
Confira o vídeo do debate na íntegra!
Não sou robô: pós-verdade e pensamento crítico na educação
Assista ao nosso debate ao vivo sobre pós-verdade, fake news e pensamento crítico na educação!Com Amanda Rahra, cofundadora da É Nóis e pós-graduada em gestão de comunicação pela ECA-USP; Ana Paula Corti, membro da Rede Escola Pública e Universidade (REPU) e do Grupo de Pesquisa Educação, Políticas Públicas e Diversidade; e Nilson Jose Machado, professor titular da Faculdade de Educação da USP. Mediação de Antonio Lovato, cocoordenador do programa Escolas Transformadoras.
Posted by Escolas Transformadoras on Thursday, May 17, 2018