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Educadores e estudantes organizam 27 propostas inéditas com alternativas para o ensino médio

Educadores e estudantes organizam 27 propostas inéditas com alternativas para o ensino médio

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Entre outubro de 2018 e junho de 2019, organizações da sociedade civil estiveram em três cidades brasileiras para engajar professores e estudantes a contribuir com as políticas do ensino médio no Brasil. O resultado desse processo são 27 propostas construídas coletivamente, que já estão disponíveis online

Quando um grupo de educadores, estudantes e especialistas em educação se reuniu, em meados de 2018, com o intuito de construir propostas relacionadas às políticas do ensino médio no país, eles sabiam das dificuldades que estavam por vir. A construção de políticas exige convergências, colaboração e trabalho contínuo. Ademais, não havia total acordo de ideias entre os participantes. Mas eles também sabiam que as políticas de ensino médio tal como estavam – a exemplo da então recém-aprovada reforma do ensino médio – não correspondiam às reais necessidades desse nível de ensino – isso, sim, um consenso entre todos. Por isso, compreenderam que era necessário agir, juntos.

E assim foi. Em uma iniciativa da Ashoka Brasil, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FE-USP) e da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, foi lançada, em outubro de 2018, a série de encontros Construção Coletiva de Propostas para o Ensino Médio. Centenas de educadores, estudantes, gestores e pesquisadores protagonizaram todo o processo.

Em junho de 2019, após a conclusão de todas as atividades programadas, os debates foram sistematizados e transformados em um material com 27 propostas inéditas que buscam criar caminhos para a construção de um ensino médio democrático, inclusivo, integral e transformador. O documento, fruto desse trabalho colaborativo, já está disponível para consulta (clique aqui para acessar).

Tecendo diálogo entre os atores da comunidade escolar

A reforma do Ensino Médio, um dos motivos que levou à formação do grupo, foi instituída por medida provisória em 2016, pouco após Michel Temer assumir a presidência. Em fevereiro de 2017, foi aprovada como lei no Senado.

“De certa forma, essa medida reorganizou o campo progressista, porque veio de um processo não participativo, de um governo que sequer consultou a sociedade civil e tampouco criou condições para que a lei fosse implementada. Mas se éramos contra a reforma, estávamos a favor do quê? Se a gente não apresentasse uma alternativa, poderiam sugerir que estávamos a favor da escola como está. E a escola, como está, não dá conta. Nunca deu”, diz ao Escolas Transformadoras a educadora Helena Singer, que atualmente é Vice-Presidente América Latina da Ashoka e atuou como uma das lideranças dessa série de encontros.

“Atuamos para que as políticas do ensino médio atendam os interesses e desejos dos estudantes, professores e comunidades.” – Helena Singer 

Realizada nas cidades de São Paulo (na USP), Brasília (na Conane de 2019) e Porto Velho (na Universidade Federal da Rondônia, a UNIR), a iniciativa contou com o patrocínio da Fundação Santillana e Instituto Unibanco, e com o apoio de outras instituições, como a Ashoka e o Instituto Alana, por meio do programa Escolas Transformadoras.

Em um auditório, algumas pessoas estão sentadas em uma mesa no palco e outras assistem à conversa da plateia.

A participação das famílias na vida escolar foi o tema de um dos encontros. Participaram os movimentos Quero na Escola; Caravana Itinerante da Juventude; e Rede em Movimento

De início, o grupo mapeou as possíveis organizações que poderiam participar dos debates. Com poucos recursos, os responsáveis não teriam condições de organizar encontros por todo o país. Por isso, pensaram em outras formas de garantir uma representação nacional. Uma das estratégias foi a construção de um espaço virtual, onde os usuários puderam escrever e enviar propostas dentro de cinco eixos previamente definidos: juventudes; construção democrática das políticas; perspectivas curriculares; responsabilidades da sociedade com as juventudes; e gestão da educação.

Realizados aos sábados, os encontros eram abertos à participação da sociedade civil e divididos em dois momentos: no período da manhã, os presentes assistiam à apresentação de uma iniciativa inspiradora, especialmente de escolas que já atuam sob uma perspectiva transformadora; e, à tarde, as propostas enviadas virtualmente eram discutidas e aprovadas somente se houvesse consenso entre todos os participantes.

“Formamos uma comissão para filtrar as propostas antes de levá-las aos encontros. Só eram passadas adiante as proposições que estavam de acordo com os eixos e com os nossos princípios orientadores: a inclusão, a democracia, a integralidade, a contemporaneidade e a transformação”, conta Helena. “Às vezes vinham propostas de pesquisa, e não de construção de política. Isso demonstra que as pessoas ainda têm dificuldade e pouca experiência de pensar e construir política.”

Representantes das Escolas Transformadoras de São Paulo (Colégio Viver, Projeto Âncora e Cieja Campo Limpo), do Paraná (IFPR Campus Jacarezinho) e do Ceará (EEEP Alan Pinho Tabosa) estiveram presentes para fazer apresentações e participar da construção de propostas. Em Porto Velho, a UNIR e a Via Campesina formularam propostas para a realidade dos jovens do campo.

Atualmente, segundo o Inep, mais de um terço dos jovens de 25 a 34 anos sequer concluem o ensino médio. Dos cerca de 3 milhões que entram nessa etapa do ensino, aproximadamente 700 mil não chegam ao terceiro ano. 

Agora, com as propostas concluídas, a comissão organizadora pretende encaminhar esse documento a membros do Conselho Nacional de Educação e do Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação). Além disso, buscará incidir nas instituições e universidades que fazem parte do sistema educacional.

“Também queremos que o documento seja apropriado pelos jovens, sobretudo aqueles que estão mobilizados com a ocupação da política pela juventude. Esse material é uma ferramenta para que a sociedade civil promova debates e reivindique o direito de participar dos processos de tomada de decisão”, conclui.

Confira abaixo outros temas de destaque do material, comentados por Helena Singer:

Juventudes, no plural

“As políticas públicas devem considerar os diferentes modos e condições de vida juvenis no Brasil. Precisamos pensar na concretude das muitas juventudes que existem em um país que tem diferenças regionais importantes e contextos muito diversos entre o urbano, o rural e a floresta, além de uma desigualdade social acachapante. Nada disso pode ser deixado de lado nessa discussão.”

Afirmação do potencial da escola para o fortalecimento da democracia

“Defendemos a participação dos estudantes, das escolas e dos professores nos processos de decisão de políticas e políticas educacionais. A proposta é que a cada dois anos as escolas sejam convocadas a sediar debates públicos, para servirem como centros públicos de debate.”

Perspectivas curriculares

“Temos que organizar os currículos considerando os fundamentos e possibilidades das instituições e os interesses e as necessidades dos estudantes. Atuar no que se refere à remuneração e gestão da carreira dos profissionais, para o professor poder se dedicar a uma única escola, ter tempo de fazer pesquisa em seu território e se relacionar individualmente com cada estudante e suas famílias. Isso precisa acontecer de verdade.”

Mercado de trabalho

“Em relação ao trabalho, entendemos que ele não deve ser circunscrito ao ensino técnico, é um tema que tem de ser trabalhado ao longo de todo o ensino médio, com todos os estudantes. Acreditamos também na perspectiva da atuação das escolas com as potencialidades de seu território, envolvendo empresas e universidades locais.”

Responsabilidade da sociedade com as juventudes

“A escola é responsabilidade de todos nós. Do poder público, da comunidade escolar, das famílias. Por isso, as políticas de ensino médio devem prever e contemplar responsabilidades de outros agentes sociais além do sistema escolar. Fizemos algumas propostas para reiterar esse compromisso, uma delas diz que a CLT deve garantir que a família deixe de comparecer ao serviço, sem prejuízo do salário, quando é convocada para comparecer à escola.”

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