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SERTA: “A gente acredita que as diferenças também fazem parte do processo de construção”

SERTA: “A gente acredita que as diferenças também fazem parte do processo de construção”

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Por Amanda Leite

No interior de Pernambuco, no município de Glória de Goitá, escondido entre uma estrada ou outra, está localizada uma das unidades do  Serviço de Tecnologia Alternativa – SERTA. À primeira vista, a escola pode parecer tímida, com suas construções baixas que se camuflam na vegetação típica da região. Mas, não se engane: o SERTA, em quase 30 anos de existência, já transformou centenas de vidas que passaram por lá. O segredo? O diretor Germano Ferreira não esconde: a base de todo o processo de transformação é o trabalho em equipe.

“Nossa metodologia acredita que não se ganha jogo sozinho, se ganha jogo com equipe, com time montado, com compromisso e acreditando naquilo que se faz”, conta Ferreira. O SERTA nasceu em 1989, numa época de descrença na agricultura familiar, e sempre defendeu o princípio da endogenia como processo de desenvolvimento. “Nós acreditamos que é possível investir na agricultura, nas propriedades familiares, sobretudo em uma perspectiva da agricultura orgânica, o que hoje nós chamamos de agroecologia”.

Um dos projetos realizados no SERTA são os chamados mutirões: um trabalho onde os estudantes se unem na propriedade de um colega para desenvolver atividades e tecnologias nesse espaço e para sua família. Para Germano, o principal objetivo dos mutirões é socializar o conhecimento, a experiência e democratizar a participação. “O mutirão também pretende promover o empoderamento e a autoria das famílias no processo de construção do conhecimento”, explica o diretor.

Para a estudante Ana Alice, o mutirão é uma chance de conhecer um pouco mais sobre a vida do outro. “Querendo ou não, a maioria [dos alunos] mora em sítio, planta alguma coisa pra vender, pra sobreviver ou  fazer uma renda extra. É bom por conta disso: a gente conhece a realidade e como cada um trabalha diferente.” Ana Alice mora no município de Rio Formoso, em uma comunidade remanescente de quilombo, da Mata Sul de Pernambuco. O SERTA mudou o seu olhar sobre a agricultura e a vida no campo. “Não é preciso sair de onde você mora para trabalhar, você consegue transformar sua vida no seu meio”, completa. Ela também acredita que muito da mudança no seu cotidiano e na sua propriedade vem do trabalho em equipe. “Eu tenho um jeito de trabalhar em que ajudo uma pessoa e a outra pessoa me ajuda. Vamos fazendo a troca de conhecimento e assim  chegamos no resultado perfeito.”

70% dos alimentos que vão à mesa das casas brasileiras são da agricultura familiar. Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social

O ex-aluno Anderson da Silva, que também participa dos mutirões, confessa que antes não gostava de produzir em grupo. “Mas logo o SERTA me mostrou que trabalhando sozinho a gente não vai para lugar nenhum. Quando trabalhamos coletivamente, fica tudo mais fácil, mais prático”. O garoto de 21 anos acredita que o grande segredo dos mutirões é a troca de experiências. “As pessoas que vêm para a minha casa conhecem a minha realidade, novos lugares, novos costumes. Juntos nós aprendemos. Afinal, todos nós temos algo de diferente para ensinar para os outros, não é verdade?

Embora não seja sempre fácil, Germano acredita que as dificuldades e os conflitos  inerentes ao trabalho em grupo não são suficientes para desanimar. “É evidente que nesse caminho existem as divergências. Mas, a gente tem a clareza dos elementos que nos unem,  por isso superamos as fragilidades – esse é o elemento fundamental para um processo de transformação. Nós temos muita certeza daquilo que a gente faz, pra onde a gente quer ir, quais são as estratégias que definimos. A gente acredita que as diferenças também fazem parte desse processo de construção.”

Na imagem, alunos da escola SERTA trabalham juntos em uma plantação

Ferreira também defende que as ações do SERTA vão muito além do investimento nas propriedades. “Na nossa avaliação, um dos grandes impactos é na vida do estudante, sobretudo na perspectiva da sua autonomia e do seu empoderamento.” Isso porque o mutirão tem uma multifuncionalidade: não é apenas um encontro de estudantes e familiares para desenvolver uma tecnologia – existe também uma capacidade de empoderamento, focando no fortalecimento da identidade camponesa. “Então, o primeiro impacto é na vida pessoal, no sentido de os estudantes se reconhecerem e descobrirem a potencialidade que têm dentro de si”, diz.

“Eu acredito que o SERTA me transformou. Uma das coisas que me fez ser quem eu sou hoje foi o SERTA acreditar em mim e fazer com que eu acreditasse em mim mesmo. Isso foi um divisor de águas.  Hoje, o trabalho que eu faço no meu sítio em Glória de Goitá influencia até mesmo a minha comunidade,” completa Anderson, que se formou há 2 meses e continua indo ao SERTA. “Eu mantenho o vínculo com o SERTA. Me sinto muito, mas muito acolhido mesmo por essa escola”.

O Serviço de Tecnologia Alternativa – SERTA é uma das três escolas apresentadas no segundo episódio da série ‘Corações e mentes, escolas que transformam’, dirigida por Cacau Rhoden. Organize uma exibição pública e gratuita deste episódio pela plataforma Videocamp

Foto de capa: Maria Farinha Filmes

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