Escola Municipal Anne Frank (MG)
A escola é a sociedade. A escola é a comunidade. É da comunidade e para a comunidade. Para que existe uma escola se ela não tem essa função?”
Luciana Pires
Diretora
A Escola Municipal Anne Frank está localizada no bairro Confisco, comunidade de alta vulnerabilidade social na região da Pampulha, Belo Horizonte (MG). O terreno foi doado pelo médico pediatra Marx Golgher, que, por sua origem judaica, deu à escola esse nome.
A curiosidade dos alunos sobre a origem do nome da escola culminou na criação, em 2008, do Projeto Anne Frank Viva, que contempla uma pesquisa ativa sobre a história da família Golgher e um estudo sistematizado sobre o Holocausto. A partir desses materiais, as crianças são apresentadas às questões de justiça, igualdade, respeito, diversidade étnica e cultural e direitos humanos. Por meio do projeto, os alunos aproximam-se da história de vida de Anne Frank, inspirando-se e transpondo muitas das vivências da pequena menina judia para as particularidades de seus cotidianos, muitas vezes marcados por relações de conflito e violência.
A escola posiciona-se como um polo de construção de uma cultura de paz, que engloba relações além-muros. A comunidade escolar construiu, na praça em frente à escola, o Bosque da Paz, onde acontecem, mensalmente, eventos e festas da instituição escolar, como a Festa Junina. Essa ocupação do espaço público é entendida como fundamental dentro do programa político-pedagógico da escola, pois amplia o repertório e as vivências dos alunos, além de contribuir para que o lazer e o conhecimento tomem conta da área, combatendo, assim, a violência local. Além das aulas regulares, os alunos também podem permanecer no contraturno escolar para frequentar as oficinas de dança, capoeira e esportes, entre outras atividades lúdicas, que, geralmente, são ministradas por jovens da própria comunidade. A escola constitui um espaço expressivo de atuação política da comunidade e foi reconhecida, por suas práticas, pelo Centro de Referências em Educação Integral (CREI). É também uma das escolas referências do Programa Escola Integrada (PEI), da prefeitura de Belo Horizonte.
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A Escola Municipal Anne Frank acredita na educação destinada a todos, considerando suas diferenças e permitindo que os alunos sejam sujeitos transformadores de sua realidade. Para o educador Moacir Fagundes de Freitas, pensar uma educação para todos significa considerar todas as esferas e todos os âmbitos e, principalmente, cada um em sua integridade. “Além da questão da universalidade, é necessário pensar a pluralidade. Por mais que algumas mudanças dependam dos políticos e dos gestores, quem tem o maior poder para operar essas mudanças são os professores. (…) O afeto, o respeito, a igualdade e a valorização de todos levam à transformação e à mudança”, diz Moacir. Para ele, a escola tem urgência em mudar, para, principalmente, ressignificar o processo de aprendizagem.
O sonho da escola é contribuir para que as diferenças no país diminuam; para que as pessoas tenham seus direitos respeitados e possam ser livres em tempos de intolerância; para que conheçam sempre mais uma versão dos acontecimentos; e para que possam, como ele diz, “subir no palco e serem sujeitos da história”.
A metodologia de trabalho com projetos de transformação social é a principal inovação no desenvolvimento das quatro competências transformadoras (empatia, trabalho em equipe, criatividade e protagonismo social). Alguns projetos são políticas da rede pública, que partiram da prefeitura de Belo Horizonte a partir de um diagnóstico das demandas das comunidades. Eles foram ressignificados e ampliados pela escola por meio de iniciativas – Cultura da Paz, Clima Escolar, Conexão Aberta, Escola Integrada, Escola Aberta –, estimulando a participação ativa da comunidade na ocupação da escola e dos espaços públicos.
Além desses, há projetos de autoria da escola, como o Anne Frank Viva e o Anne Frank Fashion, um desfile de moda produzido em parceria com a Faculdade de Moda do Instituto de Arte e Projeto (Inap), que pretende valorizar a beleza e reforçar a identidade da comunidade de maioria negra. Nesse projeto, realizam-se oficinas de customização de roupas doadas pelos moradores, reflexões sobre o que cada pessoa expressa na forma de se vestir, a criação de logomarca própria da comunidade e também a confecção de camisetas com slogans que fortalecem a autoestima dos moradores da região. No desfile final, os moradores desenvolvem as roupas e são os modelos na passarela.
A Anne Frank busca estudar cada vez mais o indivíduo em sua dimensão integral, para aprofundar a construção de relações mais humanas e transformadoras na escola. O impacto e a influência da ação da escola na comunidade aparecem na fala das crianças, dos líderes comunitários, da representante da Secretaria Municipal de Educação (SMED) e de todos os agentes que trabalham em rede na comunidade. É ainda um espaço aberto de acolhimento e articulação de todos os agentes e movimentos de transformação na comunidade. A partir dos projetos da escola, surgem iniciativas e projetos na região, como o Centro de Referência Popular (Cerpop) e o nascente empreendimento de moda que se inicia na EJA (Educação de Jovens e Adultos). A escola trabalha em harmonia com a SMED e a Regional da Pampulha e é articulada com a rede de proteção, o Centro de Referência de Assistência Social (Cras), o posto de saúde, as universidades da região, as igrejas e todos os aparelhos públicos e atores do bairro, além de ter contato com a rede mundial de escolas Anne Frank. Todas as parcerias trazem benefícios para a escola, alimentando a troca de ideias, práticas e histórias transformadoras.
A Escola Municipal Anne Frank apresenta muitos exemplos de projetos criativos e transformadores que desenvolvem e dialogam com a cultura local e com a linguagem das crianças e dos adolescentes.
Os alunos, por exemplo, já circularam pelo bairro para entrevistar a comunidade a respeito da origem do universo, promovendo um diálogo sobre ciência e religião. Eles também já estudaram temas relacionados ao feminicídio, à ditadura e ao racismo. Todos têm criticidade, autoria e, sobretudo, desejo de trazer consciência e transformar o entorno. A escola também criou o projeto ‘História em Quadrinhos do Confisco’, idealizado pela moradora Graça e feito colaborativamente por toda a comunidade. Os quadrinhos contam a história do bairro do Confisco, onde a escola está localizada. Através desta ação em equipe, a comunidade trabalhos nos estudantes a questão do pertencimento e da identidade. Em 2017, a ‘História em Quadrinhos do Confisco’ foi vencedora da 5ª edição do Prêmio Nacional de Educação em Direitos Humanos, na categoria Educação. Confira o material aqui.
A escola é um local em que os alunos expressam suas opiniões e têm espaço para argumentar. Um aluno do 5º ano, por exemplo, foi eleito líder para gerir os gastos do Orçamento Participativo da Criança e do Adolescente (R$ 20 mil foram disponibilizados para os alunos proporem mudanças no ambiente escolar). Com isso, todos se encontraram em uma reunião para eleger e votar as prioridades da escola. Os professores não tiveram direito ao voto, apenas deram orientações quanto às opções candidatas.
Confira as fotos da Escola Municipal Anne Frank: